08 setembro 2012

Opinião

O Clube e a empresa privada
Os clubes desportivos enfrentam, no presente, uma séria concorrência da parte de empresas privadas que procuram conquistar os seus sócios, praticantes ou não, através das novas formas de marketing. Trata-se de um sério desafio que o Movimento Associativo deve encarar com seriedade, na medida em que a «mudança» de motivações, práticas e comportamentos é uma realidade bem visível, enquanto a grande maioria dos clubes desportivos mantém imutáveis (ou quase…) os seus tipos de propostas, formas de gestão e de organização.
Como bem se sabe um dos aspectos daquela mudança penetrou na nossa sociedade a partir da década de 80 do passado século, sob a forma da mercantilização de toda a actividade social, cultural e educativa. Tudo passou a ser «objecto de consumo» e os consumidores a constituírem uma ou mais «populações alvo», representando uma «procura» à espera de uma «oferta» adequada.
Claro está que esta visão, imposta por uma campanha maciça oriunda da conceção neoliberal e neo-conservadora da dinâmica social, sempre passou e continua a passar por cima de interesses de ordem individual e colectiva não compatíveis com as formas mercantis de obter lucro, características das empresas. Contudo, sendo os clubes o que são, ou seja os últimos redutos da expressão da solidariedade, do desempenho desinteressado de um serviço de interesse público e de afirmação da equidade social de acesso às práticas, naturalmente que quem possui a capacidade financeira suficiente e se preocupa, antes de tudo, com a sua imagem corporal de acordo com os valores do hedonismo e individualismo que está na moda, prefere os health clubs e outras empresas do mesmo tipo.
Esclareça-se desde já que só temos contra estas empresas a preocupação com a qualidade técnico-pedagógica da sua acção. Como empresas privadas têm toda a legitimidade de constituir um mercado e de o explorar.
Mas tem é de ficar claro que os seus interesses, formas de funcionamento e procura de lucro, nada têm a ver com o clube desportivo em que não existe qualquer preocupação com este último e em que os fundos financeiros obtidos revertem a favor do próprio clube. Nele predomina ainda a preocupação com a convivialidade, a sociabilização, a fraternidade e outros valores humanizadores de que são defensores acérrimos numa sociedade em que a sede do lucro tudo varre, degradando e desvalorizando a vida humana (desde a alimentação até às televisões).

Esta diferença é particularmente visível quando uma organização de negócios em actividade física e lazer, de carácter multinacional, aponta os «10 erros mais comuns cometidos na gestão de ginásios e instalações desportivas» e citamos:
1 - não saber vender como deve ser;
2 - não conseguir estabelecer novos contactos;
3 - não se preocupar devidamente com a retenção (?);
4 - não considerar o ginásio como um negócio;
5 - não utilizar formas de gestão adequadas;
6 - não conceber os procedimentos da forma mais correcta;
7 - não possuir os recursos indispensáveis;
8 - não ter a contabilidade devidamente organizada;
9 - não conceber que a sua empresa tem uma originalidade própria;
10 - acreditar que há formas mágicas de enriquecer.
Naturalmente que de cada um destes pontos decorrem as soluções adequadas que devem ser tecnicamente dominadas. Visando, como é natural, a obtenção do máximo lucro financeiro como acontece com qualquer outro negócio. Inclusive as forma de convívio e de aproximação visam reforçar idêntico objectivo que, como é natural, nada se preocupa com a solidariedade e a equidade no acesso às actividades que propõe.
Evidentemente que uma visão que dá lugar a uma organização deste tipo e com aquelas preocupações só é acessível a uma camada restrita da população e é esta que é visada sendo, no entanto uma minoria. E o resto da população que não possui os meios financeiros para frequentar este tipo de empresa, os campo de golfe e as piscinas privadas dos S.P.A.?
A sua defesa encontra-se nos clubes desportivos de bairro (já que as aldeias são cada vez em menor número). Que será bom reconhecerem que devem alterar as suas preocupações para revitalizar a sua vida interna, abandonando o absurdo da cópia dos grandes clubes desportivos profissionais e a procura da vitória a todo o custo que só degrada quem pratica e agrava a segregação social do acesso.
(A Mello Carvalho)